terça-feira, 28 de abril de 2015

Uma nuvem demasiado negra

Imagem via Pinterst
"Mais vale prevenir a depressão pós parto do que remediá-la". Foi este o título que me fez abrir de imediato o artigo. Um artigo que podia ser bastante mais completo, mais informativo, menos clínico e mais humano. Mas o propósito estava cumprido - falava de depressão pós-parto.

Quando soube que estava grávida, deu-se aquela espécie de pânico, aquela sensação de urgência, que nos faz saltar para o computador e começar a abrir dez separadores de uma só vez, tal é a quantidade de dúvidas, de informações, de dicas, de passos a dar, de mais isto e mais aquilo.

Sempre gostei de me informar, de pesquisar, de saber, de perceber ao ponto de poder explicar aos outros. Com o tempo, passei a conhecer, também na teoria, tudo o que acontecia no meu corpo. Sabia tudo. Sabia sempre em que estágio nos encontrávamos, o que era expectável ou não. Acreditava, e continuo a acreditar, que a informação nos permite estar mais presentes. Saber o que se passava com o meu corpo, biologicamente, fez-me também perceber o que ele precisava. Perceber o que acontecia verdadeiramente no parto, fez-me confiar mais em mim, no meu corpo e na Margarida.

Assim que a gravidez é confirmada, começa aquele acompanhamento constante. São as consultas, os exames, as análises, as ecografias, os CTG's. Na maioria das vezes, os números ficam para os médicos, enquanto as informações práticas e as dicas nos chegam através dos enfermeiros. Lembro-me de, uma vez, numa consulta de gravidez, o enfermeiro ter perguntado ao pai da Margarida se ele notava que "ela" andava mais irritada, mais sensível, acrescentando de imediato que era perfeitamente normal. Toda a gente conhece a famosa 'hiper-sensibilidade' das grávidas, certo?

Passam-se meses de uma intensa preparação para o parto. O parto. Sempre o parto, esse objectivo final. Chega o curso pré-natal e aprendemos a ler os sinais do corpo, a respirar, a relaxar, enquanto eles aprendem a massajar-nos, para aliviar o nosso desconforto. Sempre com o parto em vista. Dão-nos lições de anatomia e biologia. Fazemos exercícios para fortalecer o corpo e prepará-lo para o parto. Alertam-nos para o que não podemos esquecer de colocar na mala da maternidade. Relembram-nos de quantos em quantos minutos as contrações devem ser para nos dirigirmos à maternidade. Repetem a dica dos banhos quentes, mais os exercícios de Kegel para a frente e para trás. Tudo muito útil, sim senhora.

Aulas teóricas. Como cuidar do recém-nascido. Amamentação. E pronto. Está feito. As mães e os pais têm, agora, toda a informação necessária.

Cheguei ao final da gestação com a sensação de que estava preparada, dentro do que é possível prepararmo-nos para o desconhecido. A verdade é que a informação toda que fui acumulando ao longo dos meses me deu a confiança necessária para ir para a maternidade a acreditar que tudo correria bem. Sabia ao que ia.

Ou assim pensava. Acreditava que me tinha informado bem, afinal, consumi tudo sobre o tema. Li todos os artigos e mais alguns. Fui às aulas práticas e teóricas. Falei com inúmeras pessoas. Frequentei fóruns. Li livros. E, em momento algum, li ou ouvi qualquer referência à depressão pós-parto.

Nas primeiras semanas da Margarida, vivi numa profunda infelicidade. Uma infelicidade muito estranha, com pinceladas de cor por tê-la, por ela ser saudável, por ser tão perfeita. Mas sempre aquela nuvem negra, demasiado negra, a pairar. Numa consulta, a minha médica perguntou se me sentia triste. Disse que sim. Explicou-me que era normal. Obviamente, já eu tinha, entretanto, pesquisado sobre o assunto - sempre arrumado como um simples 'babyblues'. Até que a médica me alerta para o facto de o meu 'simples e normal babyblues' já se arrastar há três semanas - era importante estar atenta, porque podia tratar-se de uma depressão pós-parto. Fiquei assustada. Porque é que ninguém me tinha falado sobre isso antes?

Como assim?! Eu, que sempre desejei ser mãe, que adoro a minha filha recém-nascida, com uma depressão pós-parto?! A verdade é que sim, é possível. Se aliarmos o turbilhão das alterações hormonais do pós-parto, ao cansaço, e, muitas vezes, a um estado físico ainda muito debilitado, (ou até a um parto difícil), temos os ingredientes perfeitos para uma depressão pós-parto - aquela que as mães têm de esconder, porque, afinal, "como é que podes estar infeliz com uma coisinha dessas nos braços?!".

Felizmente, no meu caso, a sensação de infelicidade e os ataques de choro compulsivo foram passando ao fim de algumas semanas. Tive a felicidade de ter conhecido outra mãe que me fez sentir normal, que me fez repetir todos os dias o mantra 'vai passar'. Tenho a felicidade de ter um companheiro que me ouviu e percebeu, confirmando, rapidamente, que algo não estava bem. Soube respeitar, ainda que um bocado perdido - afinal nunca ninguém tinha tocado no assunto! Nunca nenhum enfermeiro lhe disse "a sua mulher agora está bastante sensível à custa das alterações hormonais da gravidez. Vai ter de ter paciência. O mesmo acontecerá no pós-parto, mas em dose dupla ou tripla, porque as hormonas terão de fazer o processo inverso, mas num espaço de tempo alucinante".

A história do 'babyblues' é, muitas vezes, redutora. E perigosa. É importante chamar as coisas pelos nomes e deixar claro que, sim, é normal ter um ou outro momento de tristeza, de choro, de nostalgia - isso é babyblues. E que não, não é normal passar dias e dias com uma sensação de infelicidade que parece corroer as entranhas. É importante alertar e informar, sobretudo, os companheiros. São eles as nossas principais bóias de salvamento.

Senhores que ministram cursos pré-parto, que escrevem livros, que gerem sites sobre o tema, será que não há aí um espacinho para se falar, um bocadinho que seja, da mãe e do que ela precisa DEPOIS do parto?

"Mais vale prevenir a depressão pós parto do que remediá-la".

Oh Happy Daisy | Facebook

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Afinal, o que é isso do instinto materno?

Imagem via Pinterest
Após o nascimento da Margarida, não tardou muito até surgir o meu primeiro contacto com esse tal 'instinto materno'. Até então, associava o conceito a uma espécie de instinto de protecção da cria, muitas vezes a tocar ali no animalesco, se necessário. E, de facto, as mães fazem-no, todos os dias. Mas os pais também.

Quando passei para o outro lado da barricada e, também eu, me tornei mãe, percebi que, sim, as mães sabem de coisas que mais ninguém sabe. As mães antevêem, pressentem, sentem! As mães sabem antes dos restantes. 

No início, quando ainda desconhecia o poder desse instinto, não o soube reconhecer. Toda a gente me dizia que as bolinhas brancas que a Margarida (com pouco mais de um mês, na altura) tinha na boca, eram restos de leite. Algo me dizia que não, mas eu nem sabia que voz era essa que insistia 'olha que não, tu sabes que não é leite'. Com a ajuda do Google, percebi em alguns minutos do que se tratava e, no mesmo dia, nas urgências, a candidíase oral foi confirmada.

Seguiu-se uma e outra situação. Situações em que eu dizia 'hmm... não, não é só isso' e em que acabámos por ir às urgências confirmar que, em 99% das vezes, não é mesmo 'só isso'.

As mães sabem muito. Não sei se o facto de termos tido aquele ser a desenvolver-se dentro de nós, em nós, será o responsável por esta ligação tão sensitiva, tão instintiva. Mas acredito que o amor das outras mães, as que não o são de forma biológica, dê também direito ao pack completo, com todo o instinto maternal, como mães que são. 

Ao longo deste ano, foram várias as situações em que confirmei o que o meu instinto me dizia. E ele está sempre ali, alerta, prestes a disparar! Com o tempo, acredito que nós, mães, consigamos dar cada vez mais ouvidos a essa vozinha que, se repararem, está sempre presente. Às vezes podemos nem saber que raio se passa, mas sentimos que não é uma mera indisposição, ou que aquela febre traz água no bico, ou que não, aquilo não é culpa dos dentes que estão a nascer.

Fui pesquisar um bocadinho mais sobre o que é isso do instinto materno. Ao contrário dos répteis, esses pais desnaturados, que se limitam a depositar os ovos num local com condições favoráveis (lembrei-me de uns quantos assim!), a evolução fez com que os mamíferos gerassem as crias nas suas próprias entranhas. Como resultado, para que possam nascer (e ambos sobrevivam), os recém-nascidos são ainda muito vulneráveis. Mais uma vez, a evolução afinou o processo e dotou os mamíferos de antenas especiais, que asseguram um cuidado extra, este instinto que os une às crias. Ainda que exposta da forma mais simplista possível, esta é, basicamente, a explicação que encontram. 

Obviamente, quanto mais informadas, atentas e interessadas forem as mães, mais facilmente se conseguirá entender o que a tal voz poderá querer dizer - nem que para isso tenhamos de recorrer ao Google! Mas é precisamente esse tal instinto que nos faz abrir o Google. É esse momento em que nos ocorre 'hmm... algo aqui não bate certo'.

Ainda que defenda a igualdade (na medida do possível) entre pai e mãe, os pais são demasiado pragmáticos. Mas eles também sabem muito - porque a mãe faz o favor de transmitir toda a informação que recolheu dos 14 artigos que leu e dos 7 posts que encontrou num fórum qualquer. 

São assim as mães dos tempos modernos, que continuam a querer assegurar a sobrevivência dos seus recém nascidos - pelo menos até eles terem uns 60 anos.

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terça-feira, 7 de abril de 2015

Um ano de Margarida

Sempre soube que ia ter uma filha chamada Margarida. Não sei muito bem explicar essa certeza, sabia, sentia. E não, não tinha nada a ver com aquelas coisas de miúdas, que sonham com os filhos, dão-lhes nomes, imaginam cenários. Não. A Margarida era concreta. Sabia que ela chegaria. Não era "uma Margarida", era "a Margarida". Eu só não a conhecia, ainda.

Senti-la crescer em mim foi estranho. Ali estava ela, dentro de mim, mas de forma tão abstrata. Tantos órgãos, tanta pele a unir-nos, mas também a separar-nos. À medida que os meses foram passando e o parto se aproximava, mais do que vê-la, ansiava ouvi-la. Queria (re)conhecê-la, descobrir tudo sobre ela.

Foram anos a sentir que a Margarida, um dia, chegaria. A minha Margarida. Mas quem chegou, há precisamente um ano, foi antes a "nossa Margarida". A Margarida que é tão minha quanto do pai, que é o nosso reflexo, que nos transforma todos os dias em algo, seguramente, melhor.

Hoje, mais do que celebrar o primeiro ano de vida da nossa filha, celebramos o nosso primeiro ano enquanto pais. Um ano que acredito ser o mais desafiante. De repente, a vida muda radicalmente e não há livros que nos preparem, verdadeiramente, para o turbilhão que se seguirá. 

Hoje vou relembrar cada pedacinho desse dia, as horas que antecederam o nascimento, o primeiro som, as lágrimas do pai, o meu alívio, o nosso abraço, inevitavelmente o sofrimento físico, mas, acima de tudo, vou deixar-me levar por este encantamento, este amor que me faz relembrar tudo com um sabor ainda mais especial. 

Hoje vou, também, sentir orgulho em mim. Vou sentir-me uma privilegiada por ter sido parte tão activa no nascimento da pessoa mais importante do (meu) mundo. Se o nascimento de um filho é sempre emocionante, fazer parte desse processo é simplesmente mágico. Um ano depois, olho para trás e sinto que aquilo que ali se passou, naquela sala de partos, foi pura natureza, mesmo com todos aqueles profissionais à nossa volta - foi entre mim e ela. Um corpo que se contrai para ajudar, e outro, pequenino, que sabe exactamente o que fazer para aproveitar o balanço.

Sobrevivemos ao primeiro ano, vivendo tudo intensamente. E o saldo não poderia ser mais positivo. 

Sempre soube que teria uma filha chamada Margarida. A nossa Margarida. Assim mesmo, tal como é.

Parabéns, meu amor*

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